quinta-feira, dezembro 02, 2010

Manifesto de uma turis (ta – móloga)

Sabe aquela sensação de dever cumprido, de vitória e de realização profissional? Parece-me utopia para aqueles que, como eu, escolheram a atividade turística para investimento de carreira. Independente do motivo que levaram a essa escolha, acredito que falo por todos os colegas de classe quando afirmo que a sensação é de um “beco sem saída”.
Por investimento entende-se muito mais do que o quesito financeiro. Como qualquer outro curso há uma grade horária pesada, projetos, livros, trabalhos, palestras, eventos, provas. Então por que continuamos sendo a escória dos cursos de graduação?
É até certo ponto compreensível que o termo turismólogo ainda cause estranheza na sociedade como um todo já que estamos tratando de um curso relativamente novo no Brasil. Mas apenas o curso é novo. A atividade organizada como tal nos remete à Europa no século XIX com uma pessoa de visão a frente da sua época, o famoso Thomas Cook.
Aulas de história à parte, talvez a sociedade precise mesmo que os bacharéis em Turismo provem o valor da sua existência, do seu profissionalismo. Agora, olho para as políticas públicas relacionadas ao setor e me pergunto: como isso seria possível? Como teremos um reconhecimento se as autoridades governamentais ainda crêem que de paisagens naturais exuberantes e corpos esculturais vive a atividade?
O Brasil tem a felicidade de possuir uma extensão territorial de caráter continental que nos abençoa com sistemas naturais completamente heterogêneos entre si. Um litoral imenso de areias brancas e água morna. Uma flora e fauna sem igual no Pantanal. A neve no Sul. Isso tudo não é novidade para aqueles que tiveram um bom professor de geografia.
Diante desse cenário como podemos receber menos turistas estrangeiros do que muitas cidades européias? Por que não conseguimos alavancar o turismo interno com sucesso? Por que não conseguimos desenvolver as regiões através do Turismo?
A falta de infra-estrutura e de investimentos em posições estratégicas como portos, aeroportos, capacitação, consciência ambiental, desenvolvimento sustentável me preocupam, mas não me desesperam. Sei que são problemas que exigem soluções complexas e muitas cifras de Real.
Contudo, o desespero me ocorre quando vejo bacharéis sendo massacrados e sofrendo estupros no mercado de trabalho. Desculpem-me, mas não acho outro termo para definir uma jornada de trabalho de mais de 44 horas semanais, sem direito a feriados ou finais de semana e apenas uma folga semanal por um salário na carteira beirando os R$ 800,00.
Não que eu rejeite essa quantia de dinheiro, mas não consigo conceber com justiça que um profissional que dedicou quatro anos da sua via aos estudos, participou de estágios, fala inglês fluentemente e tem um ano de experiência profissional no exterior, necessite dobrar o turno quatro vezes para passar o Natal em família. E ainda ter a conta bancária negativa, claro.
Tenho arrepios quando penso nos grandes eventos com sede no Brasil nos próximos anos. Sinto mais revolta e náuseas ainda quando me deparo com um concurso público da EMBRATUR em que a quantidade de vagas destinadas aos bacharéis em Turismo se resume a zero. Então se estuda planejamento e política do Turismo para se passar a vida sentada em uma cadeira emitindo passagem aérea? O governo considera importante para o desenvolvimento do país abrir vagas somente para administradores e não para turismólogos?

Se essa é a posição definitiva das autoridades então prego o fechamento de todos os cursos de graduação em turismo para pouparmos nossos estudantes de toda essa palhaçada. Eu gostaria que tivessem feito isto antes do meu ingresso na universidade, confesso. Ou começamos a mudar a visão do turismo no Brasil ou uma medida drástica como essa será inevitável. E isso sim já não é utopia. Temos várias faculdades fechando as portas para o “curso do futuro”.

Não há mais alternativas. Pergunto-me diariamente o quanto em mim existe de turista e de turismóloga e se algum dia o Brasil entenderá a relação benéfica entre um e outro. Se um dia vou ver meu país crescendo economicamente e culturalmente através de uma atividade que se bem planejada pode ser o melhor processo “win-win” do mercado. Eu ganho, o turista ganha, você da comunidade ganha, a natureza e o governo ganham. Na verdade, ganharíamos todos. Mas o Brasil não está interessado em ganhar. Que pena!

2 comentários: